Contribuído por Cristão
Antitípico.
Charles Taze Russell
acreditou até sua morte que cada palavra na Bíblia é inspirada por Deus
e que todas as nuances e sutilezas em relatos especiais são significativos. Os
Estudantes da Bíblia,[1] assim
como vários indivíduos antes deles, entenderam que o livro de Daniel é
primariamente um livro profético para a igreja/congregação, não um livro
que apenas contém lições morais, tampouco apenas um livro de história. Assim,
cada relato do livro de Daniel, incluindo os sonhos de Nabucodonosor, tem de
ser profético e deve culminar em um cumprimento escatológico. Não existe nenhum
conteúdo descartável na profecia de Daniel – é isto que significa crer que toda
a Escritura é inspirada por Deus.
Mas nem todos concordam
com esses conceitos. Certo pastor evangélico comentou:
“Para
nós, evangélicos, a árvore cortada representa [apenas] o próprio Nabucodonosor,
pois Daniel 4:22 explica isso. E a banda que preservava o toco indicava que
Nabucodonosor não seria punido pelo que fez a Israel, mas reconheceria um dia o
Deus Altíssimo. (Daniel 4:26) Tudo isso se cumpriu nos dias de Nabucodonosor
[apenas]. (Veja Daniel 4:34-37). Alguém precisa ser
muito ignorante para acreditar que o mau exemplo do Rei Nabucodonosor,
de orgulhar-se até o limite máximo, como uma árvore que cresceu até os céus,
pudesse simbolizar o Reino de Deus.”[2]
Sem dúvidas, todo o sonho de Nabucodonosor sobre a
árvore cortada teve sua aplicação em seus dias, ninguém duvida disso e este não
é o ponto de discórdia. Mas será que essa é toda a informação dessa maravilhosa
profecia? Percebe-se que, para os evangélicos, o capítulo 4 do livro de Daniel
e o sonho não são proféticos e não possuem relação com Cristo, apenas são
vistos como um relato histórico para que Deus nos ensine uma lição moral, a
saber, que a soberba é uma qualidade deplorável. Em outras palavras, o sonho da
árvore pelo monarca babilônico não possui nenhum sentido profético para a
igreja. Isto é, a meu ver, um desperdício da mensagem inspirada e uma negação
da inspiração da Bíblia.
O apóstolo Paulo escreveu sob inspiração:
(Romanos 15:4) Pois todas as coisas escritas anteriormente foram
escritas para a nossa instrução, a fim de que, por meio da nossa perseverança e
por meio do consolo das Escrituras, tivéssemos
esperança.
Se entendermos o sonho da árvore de Nabucodonosor apenas como um evento histórico que nos ensina uma lição moral, que é basicamente a proposta supracitada pelo pastor evangélico e a atual postura do protestantismo, isso não nos dá nenhuma esperança, contrariando o ensinamento apresentado em Romanos 15:4. Os Estudantes da Bíblia e outros eruditos protestantes do século 19 se recusaram a crer que o sonho de Nabucodonosor possui apenas uma lição moral para os cristãos, pois isso vai contra o tema central do livro de Daniel, a saber, que o governo da humanidade pertence a Deus e Ele permite que outros governem, mas, por fim, Deus o dará ao Messias. Sendo este o tema do livro de Daniel, os relatos, principalmente os sonhos, têm de estar conectados com o Cristo e com o sonho da estátua no capítulo 2. A Bíblia diz que é de Cristo que “todos os profetas dão testemunho”. (Atos 10:43, compare com Lucas 24:27 e Atos 3:19-26.)
O TEMA
CENTRAL DO LIVRO DE DANIEL É: A JEOVÁ PERTENCE O REINO DA HUMANIDADE, E OS
REINOS GENTIOS EXISTEM PORQUE JEOVÁ OS TOLERA. POR FIM, O MESSIAS É QUEM
REINARÁ PARA SEMPRE.
No
livro de Daniel, encontramos um quadro da dominação da terra pelas potências
gentias durante um período de tempo. O capítulo 2 contém a visão profética,
recebida pelo monarca babilônico, da grande estátua que Daniel sob inspiração
mostrou representar a marcha das potências mundiais gentias que termina com sua
destruição por parte do Reino estabelecido pelo “Deus do céu”, Reino este que a
partir de então passa a governar toda a terra. (Daniel 2:31-45)
O
erro de muitos é achar que os sonhos e as visões do livro de Daniel não possuem
relação entre si e apenas nos ensinam lições morais. Mas isso é absurdo.
Obviamente, se acreditarmos que a profecia foi inspirada por Deus, não poderemos
fugir da conclusão de que toda ela está interconectada com o tema central
(i.e., o Reino da humanidade pertence a Deus e ele o dará ao Cristo),
inclusive o sonho da árvore.
No
capítulo 2, o sonho da grande estátua começa na cabeça de ouro, que representa o
império babilônico, a primeira potência mundial a ‘pisar Jerusalém’, e que
derrubou a dinastia de Davi e deixou vago “trono de Jeová” em Jerusalém. (1
Crônicas 29:23) Foi isso que deu início aos tempos dos gentios (a estátua), que
é o tempo durante o qual Jerusalém, ou o trono de Jeová, é pisoteado pelas
nações não judaicas. Durante esse tempo, os gentios governam o mundo sob a
permissão de Deus, mas o reino de Deus não possui um rei da linhagem de Davi e
escolhido por Deus.
No
capítulo 4 do livro, Nabucodonosor recebe outra visão. A visão simbólica é de
uma imensa árvore; a qual um anjo do céu ordenou que fosse derrubada. O toco
dessa árvore foi então restrito com bandas de ferro e de cobre, e teve de
continuar cortado entre a relva do campo até se terem se passado “sete
tempos”. (Daniel 4:16)
“Sete Tempos” – uma expressão
escatológica Sem dúvidas os “sete tempos” da demência de Nabucodonosor tiveram relação
imediata que correspondeu a 2520 dias literais, mas o relato de Daniel
4:13-17 é especial demais para ser compreendido apenas como um evento do qual
podemos tirar lições morais, que é a visão atual do protestantismo. É
inconsistente alegar que o capítulo 2 e também os capítulos 7 até o 11
possuem sentido profético para a congregação, mas que o capítulo 4 não possui
e que é apenas um “evento histórico que nos ensina que a soberba é deplorável”.
Portanto, o capítulo 4 e os “sete tempos” devem ter cumprimento escatológico.
Vejamos 4 evidências disso. 1)
O dobro de três tempos e meio.
A expressão “tempo, tempos e metade de um tempo”, ou “tempo, tempos e uma
metade” equivale a 3 tempos e ½ e é escatológica. Isso indica que “sete
tempos”, que é o seu dobro, também é escatológica. Sobre o fim dos tempos,
lemos resumidamente em Daniel 12:4-7: E quanto a
ti, ó Daniel, guarda em segredo as palavras e sela o livro até o tempo do fim. Muitos [o]
percorrerão, e o [verdadeiro] conhecimento se tornará abundante.”. . . “Quanto tempo levará até o fim das
coisas maravilhosas?” 7 E
comecei a ouvir o homem vestido de linho. . . “Será por um tempo designado, tempos designados e uma
metade. . .” Portanto, o
dobro de três tempos e uma metade – sete tempos – é significativo nesse
contexto e deve apontar para algo tipificado em Nabucodonosor. 2)
Um coração de animal. Esse
relato, conforme já mostrei, é especial demais para ser visto apenas como
histórico. Nabucodonosor se engrandeceu demais, e qual foi sua punição? Será
que Deus lhe causou uma doença que o acamou? Curiosamente, Nabucodonosor
recebeu um “coração de animal/besta” (chêyvâ'). (Daniel 4:16)
Pergunte-se: Era realmente necessário tudo isso para humilhar o rei de
Babilônia? Por que Deus escolheu dar “um coração de animal/besta”
ao rei, ao invés de qualquer outra punição? Essa punição é demasiadamente
arquitetada e peculiar. Portanto, deve ter cumprimento antitípico. Entenda o
motivo. No
capítulo 7, Daniel descreve os governos humanos que sucederiam o reinado de
Nabucodonosor, que é a mesma sequência da estátua no capítulo 2. Em outras
palavras, a profecia do capítulo 7 é a mesma do capítulo 2, só que, em vez de
ouro, prata, bronze e ferro, agora os governos são descritos da mesma forma
que Nabucodonosor em sua demência, como “animais/bestas” (chêyvâ'),
e
um trocadilho é feito: Nabucodonosor ganhou “um coração de animal”, mas o
animal (chêyvâ')
ganhou
“um coração de homem”. (Daniel 7:4) Portanto,
a punição especialmente arquitetada do monarca deve ser uma tipificação do
período total do domínio dos “animais/bestas” do capítulo 7, e
consequentemente da estátua. Não há sentido algum em Deus dar a Nabucodonosor
um coração de animal/besta por misteriosos “sete tempos” apenas para
humilhá-lo. Se o propósito de Deus era somente humilhar o rei, a coisa poderia
ter sido muito menos arquitetada. Nem mesmo uma visão teria sido necessária!
Portanto, ter o monarca recebido um coração de animal/besta conecta o sonho
da árvore com as bestas do capítulo 7 e a estátua do capítulo 2. 3)
A conclusão do sonho. O
sonho do rei começa no v.10 e termina no v.17 do capítulo 4, e a
interpretação de Daniel sobre o sonho termina no v.25. O modo como a
descrição do sonho é concluída é escatológico. Por que Deus daria aquela
punição específica a Nabucodonosor? A Escritura diz: para que os
viventes saibam que o Altíssimo é Governante no reino da humanidade e que ele
o dá a quem quiser, e estabelece nele até mesmo o mais humilde da humanidade. (Daniel 4:17) Essa
é uma conclusão muito sugestiva e especial, uma indicação incontestável de
que o sonho possui aplicação escatológica, pois o próprio Deus conecta o
sonho com o reino sob a regência de Jesus Cristo, o “mais humilde da
humanidade”. (1 Samuel 2:8) O próprio Daniel ainda conclui que os sete
tempos servem para mostrar que Deus é o Governante do reino da humanidade,
o qual fora entregue a todo o domínio gentio, e o fim dos sete tempos
é relacionado com o domínio do Messias. (Daniel
4:25) passarão sobre o senhor sete tempos, até que
reconheça que o Altíssimo é Governante no reino da humanidade e que ele o dá a quem quiser. O
reino de Nabucodonosor é chamado de “o reino da humanidade”, e a visão diz que é no fim dos sete
tempos que o reconhecimento do Altíssimo como Aquele que tem o reino da
humanidade é percebido pelo monarca. Isso prova que Nabucodonosor é um tipo
profético das potências mundiais que o sucederam e que a árvore do sonho não
é o reino de Nabucodonosor, mas o “reino da humanidade”. Em vista disso, é evidente que esse
relato é especial demais para ser visto apenas como histórico e do qual
podemos apenas aprender lições morais que podem ser encontradas em abundância
nos livros de Provérbios e Eclesiastes. Ele necessariamente tem de ter
aplicação profética e escatológica em Cristo. 4) A natureza obscura da expressão “sete
tempos”. Deus sempre pune de
maneira clara aqueles que merecem punição. Todavia, nenhum período de punição
na Bíblia é tão obscuro quanto “os sete tempos”. Afinal, quanto tempo são
“sete tempos”? Achamos pistas para isso no último livro da Bíblia. Em
Apocalipse 12:6 lemos que Deus preparou um lugar no ermo para que “a mulher”
seja alimentada por 1260 dias. No versículo 14, menciona-se a mulher sendo
alimentada por “um tempo, e tempos, e metade de um tempo”. Portanto, 1260
equivalem a três tempos e meio. Assim, o dobro de três tempos e meio equivale
ao dobro de 1260 dias – 2520 dias, ou sete anos judaicos. (360 x 7 =
2520 dias) Foi esse o tempo de demência de Nabucodonosor. Como
isso evidencia um tipo profético? Considere as seguintes perguntas: § Por
que Deus revelou a duração exata de sete tempos apenas no último livro da
Bíblia? § Por
que sete tempos, e não cinco, nem três?
O
número sete é escatológico, e está ligado com as profecias
messiânicas. (Leia Daniel 9:25 e Apocalipse, capítulos 1 e 5.) § E
se os sete tempos equivaleram a sete anos, por que a Bíblia não disse “sete
anos” logo de uma vez? A
única razão que justifica todo esse obscurantismo na linguagem é que os sete
tempos possuem significado tipificado e escatológico. Do contrário, o relato
inteiro se torna uma cebola em uma salada de frutas. Repito, se removermos o
caráter profético da visão como faz o protestantismo atual, o relato de
Daniel 4 se torna inútil para nós. |
Se
crermos que cada relato foi incluído na Escritura para um propósito
específico e que o livro de Daniel e as visões de Nabucodonosor são proféticas,
não apenas históricas, não há como fugir da conclusão de que o relato da queda
de Nabucodonosor é demasiadamente arquitetado e especial do início ao fim e,
assim sendo, deve ter sentido antitípico. Os “sete tempos” de demência
animalesca/bestial de Nabucodonosor são igualmente especiais e devem tipificar
todo o período do reino de “animais/bestas” no capítulo 7, que é o mesmo
período da estátua no capítulo 2. Essa cosmovisão é tão evidente que vários
eruditos concluíram a mesma coisa antes mesmo de C.T. Russell. Sobre isto, o livro Testemunhas de Jeová – Proclamadores do Reino de Deus, capítulo 10, p. 120, disse:
O irmão Russell não alegou ser o primeiro a
discernir [as doutrinas corretas], e reconheceu abertamente estar endividado
com outros pela ajuda que prestaram durante seus primeiros anos de estudo das
Escrituras. Falou com apreço da boa obra que vários movimentos da Reforma
fizeram visando deixar brilhar a verdade cada vez mais. Ele citou nominalmente
certos homens de mais idade, como Jonas Wendell, George Stetson, George Storrs
e Nelson Barbour, que contribuíram pessoalmente de vários modos para seu
entendimento da Palavra de Deus.
O próprio rei [Nabucodonosor] representa [= tipifica] a
sucessão da soberania imperial até que venha o reino de Cristo; os “sete tempos”
que passaram por ele devem, portanto, representar todo
o período de degradação no reino gentio, desde os tempos de Nabucodonosor até
sua redenção completa. (p. 356) [O grifo
é meu.]
BIRKS adiciona:
O tempo, tempos e metade de um tempo,
que em termos é a metade do período [de sete tempos], evidentemente vai
corresponder [...] à duração tipificada
desses sete tempos. (p. 356)
[O grifo é meu.]
O autor completou:
O registo completo do sonho de Nabucodonosor possui claramente um
caráter tipificado. O profeta dissera perante ele: ‘Tu és a cabeça de
ouro’. Agora, a cabeça de ouro prefigurava o curso
completo do domínio gentio, desde o tempo do profeta até o reinado glorioso do
Messias. (p. 355) [Todos os grifos são meus.]
Henry Grattan Guinness (1835-1910), teólogo protestante irlandês,
estudioso da profecia bíblica e cronologista perito, escreveu em seu livro Approaching Time of the Age:
A visão da árvore não
simboliza apenas os sete anos de insanidade de Nabucodonosor, mas esse
incidente também tipifica alguns elementos
morais e cronológicos da sucessão das monarquias gentias, das
quais Nabucodonosor era cabeça e representante. (p. 347) [O grifo é meu.]
Joshua William Brooks (1790-1882), foi um pregador reformado da igreja da
Inglaterra. Em seu livro Elements of Prophetical Interpretation (1841)
ele escreveu:
. . . eu notei uma objeção quanto à expressão ‘tempo, tempos, etc…’ ser
entendida como mística [simbólica],[3]
tiradas do fato de que ‘sete tempos’ do capítulo iv.23, tendo se cumprindo
literalmente com o fato de Nabucodonosor ter sido removido por sete anos da
soberania de seu império: pois a relação de um fato histórico em termos literais
não é razão alguma para que tais termos não serem usados em sentido místico
[simbólico] em alguma outra instância. (p. 250) [O grifo é meu.]
Da mesma forma, há outro evento que
leva à mesma data: os três tempos e meio têm um alto grau de
probabilidade, supostamente uma fração dos sete tempos, dos quais sete tempos devem ser ‘os tempos dos gentios’, i.e. os
tempos do domínio gentio sobre Israel. (p. 337) [O
grifo é meu.]
Por este comentário, fica claro que o autor entendia os sete tempos de Nabucodonosor como uma tipificação de todo o domínio gentio.
John Aquila Brown
(1781-1842), estudioso da profecia bíblica, também chegou à mesma conclusão de
que o sonho de Nabucodonosor simbolizou todo o domínio gentio, isto é, todo o
“reino da humanidade”.
Os
sonhos de Faraó foram duplos para ele, a fim de estabelecer a certeza da
revelação; e que foram também assim no caso do monarca babilônico há, penso eu,
evidência incontestável para provar. E por tal razão pode ser afirmado que a visão da árvore frondosa e aspirante simbolizava os
quatro impérios igualmente com a imagem [da estátua], e [está] relacionada também com os quatro impérios que haviam de ser
estabelecidos na Terra;
no entanto, rendendo-se finalmente a Ele, que é o único Governante legítimo das
nações; os poderes das nações estando então convencidos “que o Altíssimo é o
governante no reino dos homens, e ele o dá a quem desejar.” Essa, portanto, deve ser considerada a visão dos “sete
tempos”, ou o período do grande destino das quatro monarquias universais.[4] [O itálico é do autor, grifo em
vermelho é meu.]
Brown defendeu que os dois sonhos de Nabucodonosor, o da árvore e o da
estátua, são interligados, e isso significa que os sete tempos de demência de
Nabucodonosor tipificam todo o domínio gentio até o reino de Deus ser
estabelecido. O autor adiciona: “Nabucodonosor foi um tipo [profético], penso eu, dos reis tirânicos da
terra.” Em harmonia com isso, na obra The
Preacher’s Complete Homiletical Commentary
(1892), dos autores Joseph Exell, William Jones, George Barlow, W. Frank
Scott, e outros, nós lemos:
[...] os sete anos da degradação animal
do monarca durante sua insanidade correspondem ao
período do domínio gentio representado pelas bestas [= animais] selvagens da
visão subsequente. (Sobre Daniel, capítulo 4) [O grifo é meu.]
Edward Bishop Elliot (1793 – 1875) foi um teólogo e erudito bíblico inglês, pertencente ao movimento batista. A sua obra Horae Apocalypticae é considerada por certos membros do movimento batista como o comentário padrão sobre o livro de Apocalipse. Ele defendeu o mesmo que os demais eruditos protestantes de que “A insanidade e a degradação de Nabucodonosor tipificaram o seu império e sua apostasia de Deus”.[5] O teólogo batista ainda adiciona:
Uma medida muito
similar de dúvida [...] tem a ver com a questão da época da terminação dos sete
anos da degradação bestial de Nabucodonosor; não
posso evitar presumir que tal realização simbolize a [inteira] degradação pagã,
e desvio de Deus, dos quatro grandes impérios mundanos, dos quais ele
[i.e., Nabucodonosor] era o representante.[6]
Sir Isaac Newton comentou algo que nos aponta para os
sete tempos de Nabucodonosor como proféticos:
o Apocalipse de São João é
escrito no mesmo estilo que as profecias de Daniel, e tem a mesma relação com
elas que elas têm uma com a outra; de modo que todas elas juntas
formam uma profecia completa e uma interpretação
dela. A profecia é distinguida em sete partes sucessivas pela
abertura dos sete selos do Livro que Daniel foi ordenado a selar (Daniel xii.
4, 9.) e, portanto, é chamada de Apocalipse ou Revelação de Jesus Cristo.[7]
Repito: se presumirmos que cada relato no livro de
Daniel foi incluído para um propósito específico, não há como fugir da
conclusão de que o sonho de Nabucodonosor no capítulo 4, assim como o capítulo
2 e os demais, está relacionado com o Cristo e, portanto, tem de tipificar algo
maior. Cito mais uma vez Romanos 15:4:
Pois todas as coisas escritas
anteriormente foram escritas para a nossa instrução,
a fim de que, por meio da nossa perseverança e por meio do consolo das
Escrituras, tivéssemos esperança.
Daniel interpretou o sonho como significando que o
monarca perderia seu reinado por “sete tempos” (= 2520 dias) e então o teria de
volta depois que humilhasse seu coração e percebesse que Deus era de fato o
governante no Reino da humanidade, não no
“reino de Babilônia”. Então Nabucodonosor realmente foi removido de seu reino
por 7 anos judaicos. A maioria das pessoas pensaria que isso é tudo: Deus deu
ao monarca um sonho e ele foi interpretado pelo profeta Daniel e então
cumpriu-se exatamente como ele interpretou – o relato não tem serventia alguma
para nós e fim da história. Entretanto, os Estudantes da Bíblia e muitos
eruditos protestantes entenderam que o que aconteceu com Nabucodonosor não foi
uma profecia para humilhar um rei do passado, mas um ato/drama profético
que aponta para o governo de Cristo. Em outras palavras, a demência vivida por
Nabucodonosor não foi o cumprimento da profecia no sonho, mas a dramatização
profética de seu próprio sonho, assim como Jonas no ventre do peixe dramatizou
os três dias que Cristo esteve na sepultura; Moisés dramatizou
os 40 dias que Jesus ficou no ermo; Aitofel e Davi dramatizaram, respectivamente,
Judas Iscariotes e Jesus Cristo; Isaque e Abraão dramatizaram o
sacrifício de Jesus Cristo, etc.
Todos os relatos especiais das Escrituras Hebraicas –
Abraão, Sara e Agar; Abraão e Isaque; Esaú e Jacó; José e seus irmãos; etc; –
são atos/dramas proféticos, e isso fica ainda mais evidente nos
livros dos profetas maiores, tais como Daniel, Ezequiel, Isaías e Jeremias.
Dissertação
sobre dramas proféticos As profecias nem sempre se limitam a palavras. Algumas profecias nem ao
menos contém palavras, apenas a dramatização, como é o caso de Jonas no
ventre do peixe. Ele tipificou Jesus Cristo na sepultura por 3 dias. É
verdade que muitas vezes apenas palavras são ditas, mas em muitos outros
casos a profecia é feita em caráter duplo: uma parte contém apenas palavras
proféticas e a outra parte contém a dramatização feita pelo
profeta. A dramatização é um recurso visual que torna a profecia mais real
para a audiência. Isso ocorreu inúmeras vezes com Ezequiel, Jeremias e
outros. Para seu estudo pessoal, estude os seguintes textos e reflita em como a
dramatização da profecia é feita em adição às palavras. Você consegue
encontrar mais profecias com este caráter duplo? Não esqueça de compartilhar
suas pesquisas nos comentários no final do artigo.
No caso de Ezequiel, muitas de suas profecias se cumprem em Apocalipse. A
profecia sobre “a Casa”, de onde sai “água” em Ezequiel 47:1 se cumpre em
Apocalipse 22:1. O mesmo ocorre em toda a profecia de Isaías, Daniel,
Jeremias e outros – o cumprimento antitípico delas é em Cristo e na
restauração de todas as coisas. Dizer que tais profecias apenas “nos lembram de lições”, mas que não se aplicam a nós, é heresia; esta é um pecado de
desassociação. É inconsistente alguém afirmar que acredita nas Escrituras
Sagradas e negar que as profecias – todas elas – culminem em um cumprimento
maior em Cristo Jesus e na restauração de todas as coisas; é a mesma coisa
que afirmar crer na Bíblia e ainda assim crer que Adão e Eva não existiram e
que Charles Darwin estava certo em tudo que afirmou. Em vista disso, minha conclusão é que os sete tempos de demência
animalesca de Nabucodonosor não são o cumprimento das palavras no
sonho, mas a dramatização do sonho. Tudo isso é uma só profecia sendo
feita, não sendo cumprida. O relato é profético para nós, não apenas
histórico. Nabucodonosor é um tipo profético de todo o domínio “animalesco”
dos reinos gentios e os “sete tempos” são a duração da estátua no capítulo 2
e dos reinos animalescos no capítulo 7. |
Raciocinemos um pouco. Quem se importa com esse rei governando os babilônios? A Bíblia não é um livro de história para Babilônia, mas
um livro de esperança para o “Israel de Deus”, a igreja ou congregação.
(Gálatas 6:16) Quem se importa se Nabucodonosor pastou
por sete anos, sete dias ou sete meses e depois recuperou seu reino ou não? Isso
não faz diferença nenhuma para o povo de Deus. Eu não poderia me importar
menos com aquele rei soberbo. Com base em Romanos 15:4, o ponto que nos dá
esperança é: Quanto tempo levará até que
um filho de Davi se torne rei de “Israel” mais uma vez e por fim assuma o
“Reino da humanidade”? Assim, não vejo motivos para não entender o sonho da
árvore como profético para o povo de Deus. Se
olharmos para o relato apenas como histórico, isso não nos dá esperança alguma,
mas se o enxergarmos como profético para o povo de Deus, isso sim nos dá
esperança!
Em vista
disso, são justificadas as palavras de Edward
Bickersteth (1786-1850): “Tenha em mente o grandioso fim de todas
as profecias, Jesus Cristo.” [8]
Conclusão
A
análise aqui apresentada não responde a todas as questões e não creio que eu
esteja habilitado para responder a todas as questões. Portanto, não tencionei
explicar o sentido profético do sonho da árvore. Contudo, o que ficou provado
aqui é que a ideia proposta pelo pastor evangélico, a saber, de que ‘precisa ser muito ignorante’ para afirmar que o
sonho da árvore de Nabucodonosor representa algo maior em Cristo, é em si mesma
uma expressão de ignorância.
Será
que todos os estudiosos citados eram ignorantes? Claro que não. Eles sabiam
exatamente o que estavam defendendo. Infelizmente, o protestantismo abandonou a
visão de que a Bíblia inteira é inspirada por Deus e passou a encarar as
Escrituras apenas como um livro de ética. Em resultado disso, o entendimento
defendido pela elite do protestantismo no século 19 foi abandonado.
O
meu desejo é que a profecia volte a ser estudada com respeito e fé
inquebrantável. Espero que esta análise incentive você, leitor, a ir além do
leite espiritual e a buscar o alimento sólido. Rejeite a heresia tão propagada
atualmente de que tudo que podemos aprender dos livros proféticos são “lições
de fé”. Isso rebaixa as Escrituras Sagradas ao nível de um livro de ética.
Não
se engane: a Bíblia é um livro de profecias e de esperança para o povo
do Soberano Senhor Jeová.
Notas:
[1] Grupo fundado por C.T. Russell cujo grande parte de seus membros posteriormente assumiu o nome de “Testemunhas de Jeová”.
[2] Optei por não citar a fonte.
[3] Na época desses autores, a palavra inglesa mystical, ou “místico”, era comumente usada para se referir a simbolismos proféticos, e não tem relação nenhuma com misticismo, conforme usamos o termo atualmente.
[4] The Even Tide or Last Triumph, Londres, 1823, p. 133.
[5] Edward Bishop Elliot, Horae Apocalypticae, A Commentary on the Apocalypse, Critical and Historical, Including also an examination of the chief prophecies of Daniel. (Volume 3, 5ª edição, p. 270-1, nota)
[6] Ibid. Volume 4, 5ª edição, p. 239.
[7] Apud A Practical Guide to the Prophecies (1835), de Edward Bickersteth, p. 191.
[8] A Practical Guide to the Prophecies (1835), p. 25.
Contato: oapologistadaverdade@gmail.com
Os artigos deste site podem ser citados
ou republicados, desde que seja citada a fonte: o site www.oapologistadaverdade.org
Comentários
Nunca tinha me dado conta de que esse relato deve ter sentido profético pra igreja ou se torna apenas um evento histórico. Bom argumento. Mas como calcular isso? Você não explicou.
Se você quer ver a Bíblia como um livro de ética, vá em frente. Isso é heresia.
O mesmo com Oolá e Oolibá - são representações proféticas para nós, assim como o inteiro livro de Ezequiel. Dizer que isso é tipo profético e aquilo ali não é, que isso é, mas que aquilo logo ali não é, que isso é e que aquilo não é, etc... isso é um sistema de interpretação bizarro. Ou tudo é, ou nada é. Essa história de que aprendemos "lições" do livro de Ezequiel é heresia. Aquilo ali é uma mensagem repleta de modelos proféticos, não existem "lições dos portões altos que NOS LEMBRAM que Jeová tem altos padrões de moral". Isto é heresia pura. Surpreende-me que alguém ensine isso e que os anciãos aceitem essa heresia como se fosse alimento espiritual.
Realmente son muy útiles para mi estudio personal de la Biblia.
Quisiera pedirle que cuando le sea posible sacara una entrada sobre la traducción correcta de Daniel 12:4.
En este versículo a veces se pone ciencia y eso da a entender que es un conocimiento humano y otras traducciones ponen conocimiento y la versión Biblia Palabra de Dios para Todos pone “verdadero conocimiento”.
También hay traducciones que le dan una connotación negativa al final del versículo como:
Biblia Universidad de Jerusalem
'Y tú, Daniel, guarda en secreto estas palabras y sella el libro hasta el tiempo del Fin. Muchos andarán errantes acá y allá, y la iniquidad aumentará.'
También me resultaría interesante que explicarás las diferencias sobre la parte que se traduce de estas maneras tan diferentes:
Muchos correrán de aquí para allá,
muchos buscarán por aquí y por allá
Muchos andarán errantes acá y allá
Muchos lo estudiarán
hasta que muchos sean enseñados
Muchos lo consultarán
Muchos lo repasarán
Muchos lo leerán
Muchos andarán perplejos,
Muchos buscarán aquí y allí
hasta que acaben de desvariar muchos,
Mucha gente se moverá de un lado a otro
muchos lo recorrerán
Este versículo es para mi y mis conocidos de gran importancia.
Le agradecería mucho que pudiera redactar una información sobre la traducción de este versículo.
Saludos y que Jehová le bendiga por esta labor.
Muito obrigado pelo apreço que demonstra pelos artigos deste site. Poderá encontrar informação a respeito desse tema no artigo “‘A ciência se multiplicará’ (Daniel 12:4) – o que significa essa expressão?” (25-07-21), neste link: http://www.oapologistadaverdade.org/2021/07/a-ciencia-se-multiplicara-daniel-124-o.html
Grande abraço e que Jeová o abençoe.