Respondendo a um leitor sobre o artigo “Resposta a um leitor sobre os motivos bíblicos para a excomunhão (desassociação)”. Em outras palavras, o presente artigo é uma sequência de vários assuntos já tratados.
Contribuído por Cristão Antitípico.
Colocarei os comentários do leitor em itálico para diferenciá-los dos meus, esteticamente a fim de que haja melhor identificação dos discursos. Fiz algumas correções gramaticais no comentário do leitor a fim de enobrecer o nível dessa discussão sadia, mas sem alteração de sentido. O leitor disse as palavras a seguir:
Percebe-se claramente que o artigo tem sim um alvo específico! Esse meu comentário concentra-se não no artigo propriamente dito, mas na sua intenção ou efeito.
Prezado leitor, o que me preocupa já nessas suas palavras iniciais é que você é adepto da teologia “União Acima de Tudo”. Essa teologia é adotada pela igreja católica. Em resumo, é isto: a união é mais importante do que a verdade. É muito fácil de provar que esta teologia é herege, pois os mórmons estão unidos, em heresias, mas unidos; os católicos estão unidos, em heresias, mas unidos. Se a união fosse mais importante que a verdade, não haveria motivos para ser uma TJ [Testemunha de Jeová] ao invés de ser um mórmon ou um católico. No entanto, a superioridade da verdade em relação à união tem sido esquecida quando são as TJs o foco dessa dicotomia; agora a verdade não importa tanto, mas a união é priorizada em detrimento da verdade. Eu não sou adepto dessa cosmovisão, embora eu respeite sua forma de pensar.
Alguns que levantam sua voz contra a liderança das TJs, a Torre de Vigia, o Corpo Governante, seja lá qual termo usado, em geral a ideia que fica subtendida é que tais homens merecem esse ataque porque erram ou erraram em algumas conclusões teológicas.
Prezado, eu confesso que sou inimigo de eufemismos. Dizer que o Corpo Governante “errou” em algumas conclusões teológicas é um eufemismo escancarado, é “passar pano”. Pessoas foram desassociadas, perderam contato com a família e, em resultado disso, algumas se suicidaram e outras tiveram suas vidas destruídas, arruinadas porque o Corpo Governante inventou definições próprias de porneía que não foram baseadas na Bíblia. Dizer que estes foram “alguns erros teológicos” é gritante eufemismo, principalmente quando se atribui designação divina aos que erraram, o que implica obediência incondicional. Isso é um contrassenso sem fim. Eu entendo que haja erros; o que exijo, entretanto, é que a organização seja não autocrática, mas teocrática.
Erros teológicos foram os entendimentos proféticos sobre a geração que não passaria, sobre Beth Sarim e coisas do tipo, pois profecias são difíceis de entender e só as compreenderemos plenamente quando o tempo designado chegar. As falsas definições de porneía não foram “erros teológicos”, mas sacrilégios, atropelos das Escrituras que prejudicaram pessoas imensamente. Um míssil é chamado de “míssil” porque é um míssil, não uma bombinha de São João; há uma lacuna tão grandiosa entre “cometer erros teológicos” e “atropelar as Escrituras” quanto há entre um míssil e uma bombinha de São João.
Reflita no seguinte: se os anciãos da sua congregação desassociassem pessoas por causa das opiniões pessoais deles, sendo que não foram orientados para tais decisões, o que aconteceria com tais anciãos? Não seriam imediatamente removidos dos cargos? Não perderiam os privilégios? Agora responda: por que é que os membros do Corpo Governante podem cometer qualquer erro, arruinar vidas e, em vez de serem removidos dos cargos, julgados pela congregação, eles exigem a obediência absoluta dos outros?
Reflita no seguinte: se eu erro, eu tenho que ser humilde e reconhecer meu erro, fazer uma resolução que significará não cometê-los novamente e agir nos conformes; mas se os membros do Corpo Governante erram, eles tratam dos erros deles apenas como “entendimentos que não se harmonizavam com as Escrituras”, nunca pedem perdão, continuam exigindo obediência absoluta, e exigem que os outros sejam humildes para aceitar “novos entendimentos” como provindo de Jeová, assim como exigiram isso do entendimento anterior que era o contrário do entendimento vigente, e ambos foram ditos como provindo de Jeová e impostos. Isso está longe de se harmonizar com as Escrituras.
Estou mentindo ou apenas apresentando verdades inconvenientes? Eu respeito sua opinião, mas discordo totalmente de você. Não acho que criticar essas atitudes seja impróprio, pois são atitudes inteiramente dignas de críticas.
Alguns podem até achar que isso acontece porque eles são desonestos, têm interesses maldosos, são orgulhosos e são ávidos pelo poder absoluto e controle de mentes. [Não é este o meu caso.]
Resultado? Muitos que leem artigos assim acabam concluindo que deixar de apoiar essa organização é a coisa certa a fazer; consequentemente isso resulta em algumas coisas, como, por exemplo: Esses deixam de participar na obra organizada de pregação, muitas vezes limitando a sua pregação das boas novas a escrever artigos para blogs e sites e no caso de alguns artigos que apenas criticam a liderança TJ.
Prezado, eu não acredito que os membros do Corpo Governante sejam maldosos ou mal-intencionados. Ao contrário, acho que eles são pessoas bem-intencionadas que querem que os irmãos sejam salvos. O que defendo é que todos os cristãos devam prestar contas à congregação – todos sem exceções, inclusive os membros do Corpo Governante.
Eu nunca incentivei ninguém a não pregar, não se congregar ou a deixar de seguir as Escrituras. Acho imoral, entretanto, que pessoas promovam a lei da mordaça, do silêncio das críticas, sob o pretexto de que alguns poderão “tropeçar”. Isso é imoral, é usar o nome de Jeová de forma blasfema, pois significa usá-lo como muleta para manter-se no poder. “Não diga nada contra mim, confie em Jeová e me obedeça sempre” – nada é tão perverso quanto usar o nome de Jeová como muleta para seus próprios interesses e autoritarismo. Isso é blasfêmia.
E onde fica o “ensinar e fazer discípulos?” O método de ensino realizado pelas TJs de fato ajuda pessoas a se tornarem cristãos, a viver como tais, dá esperança de uma vida no paraíso, mas o que produz a pregação dessas TJs “diferentes”?
Prezado, eu concordo com isto que você falou. Acho que o ensino das TJs é ótimo e verdadeiro. As TJs cumprem a profecia de testemunhar o evangelho para todas as “nações”. (Mateus 24:14) Mas isso não tem nada que ver com o assunto. O que acontece é o seguinte: você está basicamente argumentando que, visto que as TJs ajudam pessoas a aprender verdades sobre Deus, a liderança das TJs tem passe livre para fazer o que bem desejar, ir além das Escrituras, prejudicar pessoas, arruinar vidas, e nossa única obrigação é calar a boca; afinal, as TJs ajudam pessoas a entender verdades sobre Deus. Eu acho este raciocínio um sacrilégio; seria como dizer que a igreja católica não poderia ser criticada por queimar “hereges” porque construiu orfanatos, escolas e universidades. Não me entra na cabeça a ideia de que, só porque alguém ensina verdades sobre Deus, essa pessoa ou grupo de pessoas está liberado para atropelar as Escrituras.
Outra coisa: A Bíblia diz que alguns foram designados pastores e é dito que esses precisam “pastorear o rebanho de Deus”. Mas o que acontece com essas TJs diferentes é que elas muitas vezes têm esse privilégio e uma boa capacidade para isso, mas por causa dessa nova visão renunciam a esse privilégio e ficam sem rebanho para pastorear.
Eu gostaria de propor a seguinte reflexão: digamos que um ancião congregacional receba instruções do Corpo Governante que não se harmonizam com a Bíblia, e ele percebe que tais instruções são um atropelo das Escrituras e que prejudicarão pessoas. Então ele se recusa a aplicá-las e é removido do cargo. Quem é que defendeu as ovelhas de Jeová? Ora, neste exemplo, o ancião fez o possível para defender as ovelhas de Cristo, mas foi esmagado por homens mais poderosos que impediram que ele as protegesse. Então, não foi o ancião quem renunciou pastorear as ovelhas de Cristo neste exemplo. No entanto, sabemos que surgirão pessoas que dirão que ele ‘poderia ter sido submisso, confiado em Jeová e ter continuado a pastorear as ovelhas de Cristo’.
Da mesma forma, muitos irmãos tomam posições contra a liderança não por se recusarem a pastorear as ovelhas, mas justamente por amor as ovelhas.
No caso do Corpo Governante ter dificuldade, às vezes, de chegar a uma conclusão a respeito de um assunto como no caso do exemplo citado (por·neí·a), não é por arrogância ou maldade; é porque muitas vezes realmente existem coisas difíceis de entender, e chegar a uma conclusão certa pode demorar.
Eu discordo disso totalmente, pois porneía é bem fácil de entender. O ponto é que homens atropelaram a Escritura. Os erros das definições de porneía não ocorreram porque supostamente este ‘seria um assunto difícil de entender’. A Bíblia não diz que porneía é o que o Corpo Governante disse que é. Qual é a dificuldade nisso? Qual texto bíblico daria margem para a definição de que “porneía não requer penetração nem contato pele com pele”, ou de que “inseminação artificial” é porneía? Profecias sim são difíceis de entender. Porneía, todavia, é um termo perfeitamente referencial na Bíblia. Onde está a dificuldade ou obscuridade nisso? Não há nada difícil no conceito de porneía. O ponto é que homens não se satisfazem com as informações bíblicas e vão “além das coisas que estão escritas”. (1 Coríntios 4:6) A imperfeição explica porque isso acontece, mas não justifica a perpetuação dos erros.
Até onde eu sei muitas mudanças foram resultado de cartas escritas por irmãos que expuseram seus pontos de vista e a organização analisou e viu que de fato era aquilo mesmo.
No tempo de Russell era assim. Isso mudou gradualmente até o sistema atual. Hoje em dia a lei é: aceite todas as orientações “sem pensar duas vezes”. Veja a seguinte comparação.
A postura da Torre de Vigia nos tempos de Russell quanto à liberdade individual Vejamos algumas citações sobre isso: “Não é a nossa intenção entrar no papel de Profeta a qualquer grau, mas apenas para apresentar abaixo o que nos parece bastante propenso a ser a tendência dos eventos - dando também as razões para nossas expectativas.”[1] “Não nos opomos a mudar nossas opiniões sobre qualquer assunto, ou descartando anteriores aplicações de profecia, ou qualquer outra Escritura, quando vemos uma boa razão para a mudança; de fato, é importante que devêssemos estar dispostos a desaprender erros e meras tradições, como aprender a verdade. . . É nosso dever ‘provar todas as coisas:’ - pela palavra infalível, - ‘e assegurar-se rapidamente do que é bom’.”[2] “Nem teríamos nossos escritos reverenciados ou considerados infalíveis, ou no mesmo nível com as Escrituras Sagradas. O máximo que clamamos ou que já reivindicamos por nossos ensinamentos é que eles são o que acreditamos ser interpretações harmoniosas da palavra divina, em harmonia com o espírito da verdade. E ainda insistimos, como no passado, que cada leitor estude os assuntos que apresentamos à luz das Escrituras, provando todas as coisas pelas Escrituras, aceitando o que lhe parece ser aprovado, e rejeitando tudo mais [que pareça errado]. É para este fim, para permitir que o aluno pesquise o assunto no registro divinamente inspirado, que nos intercalarmos livremente as menções e citações das Escrituras sobre as quais construir.”[3] |
Agora compare isso com as instruções contemporâneas no quadro a seguir.
A Sentinela de fevereiro de 2022, p. 6 par. 15 13 Como a nossa confiança nos anciãos pode ser testada? Talvez seja fácil aceitar a decisão dos anciãos se a pessoa desassociada não for nosso amigo ou parente. Mas e se o desassociado for alguém próximo de nós? Pode ser que comecemos a questionar se os anciãos realmente levaram em conta todos os fatos ou se julgaram o caso como Jeová teria julgado. [Ora, é um direito intransigível questionar se um julgamento foi corretamente executado. Uma pessoa tem total direito de questionar a legitimidade de um julgamento e querer se familiarizar com os fatos para que, somente então, decida tratar alguém como desassociado. Ninguém pode ser obrigado a aceitar um julgamento que entende ter sido incorreto. A instrução aqui dada é absurda. Como poderia eu confiar nisso “sem pensar duas vezes”?] 15 “. . . Porque durante a grande tribulação pode ser que recebamos instruções que sejam difíceis de entender ou de obedecer. É claro que Jeová não vai falar diretamente com a gente. É bem provável que ele use os homens que estão na liderança para nos dar orientações. Nessa época, não vai ser o momento para questionar a orientação que recebemos, talvez nos perguntando: ‘Será que essa orientação é de Jeová mesmo, ou é uma coisa que os irmãos que estão na liderança inventaram?’ Na grande tribulação, vamos precisar confiar em Jeová e na organização dele. E isso vai depender de como estamos seguindo as orientações agora. Se você já confia nas orientações que recebe hoje e obedece sem pensar duas vezes, é bem provável que você faça o mesmo durante a grande tribulação. — Luc. 16:10. A mensagem deste parágrafo e do referido artigo nessa revista é: acredite em cada palavra que vem do Corpo Governante. Se você fizer isso agora, provavelmente fará isso na grande tribulação. E se fizer isso na grande tribulação, será salvo. Portanto, você só será salvo se aceitar tudo que vem do Corpo Governante. Ou seja, a salvação está sendo imputada à organização. Mas compare isso com o que disse A Sentinela de 1 de novembro de 1990, p.26, parágrafo 16: Como cristãos, enfrentamos desafios similares hoje em dia. Não podemos participar em nenhuma versão moderna de idolatria — seja em forma de gestos adorativos diante de uma imagem ou um símbolo, seja por imputar salvação a uma pessoa ou a uma organização. (1 Coríntios 10:14; 1 João 5:21). |
Os fatos falam por si só. Peço que reflita profundamente no que tem acontecido. Lembre-se: se as pessoas boas não lutarem, a guerra já está perdida.
Se as pessoas boas não lutarem, a guerra já está perdida. |
Mas existem dois grupos: O primeiro é formado por aqueles que querem essas mudanças à base da arrogância e de ameaças. E o outro, aqueles que expõem e com paciência esperam uma possível mudança, mas caso não aconteça, por confiar na base teológica desse grupo mantêm seu apoio a ela; eu fico com o segundo.
Eu acho este raciocínio um sacrilégio, além de ser imoral e contra o ensino de Cristo, e vou provar por quê. Primeiro, este raciocínio dará poder totalitário àqueles que já detêm certa medida de poder, pois eles poderão falar e fazer tudo que desejarem sob o pretexto de que, caso estejam errados, mudarão de opinião; mas não devem prestar contas a ninguém enquanto o erro ocorre nem depois que foi percebido. Prezado, este raciocínio é, a meu ver, bizarro e perigoso demais.
Segundo, assim como Jesus ensinou, eu penso que, se há extrapolações, aqueles que extrapolaram devem responder perante a congregação. O Senhor disse:
(Mateus 18:15-17) 15 “Além disso, se o seu irmão cometer um pecado, vá mostrar-lhe o seu erro, somente você e ele. Se ele o escutar, você ganhou o seu irmão. 16 Mas, se não o escutar, leve com você mais um ou dois, para que, com base no depoimento de duas ou três testemunhas, toda questão seja estabelecida. 17 Se ele não os escutar, fale à congregação. Se não escutar nem mesmo a congregação, seja ele para você apenas como homem das nações e como cobrador de impostos.
Nenhuma exceção foi aberta pelo Senhor nestas palavras; portanto, não há exceções e isso se aplica a todos, inclusive ao Corpo Governante. Você concorda com Jesus?
Notas:
[1] “Views from the WatchTower”, 3327.
[2] “The Ten Virgins”, Zion’s Watch Tower and Herald of Christ’s Presence,
outubro de 1879, reimpressão, 38.
[3] “Worship the Lord in the Beauty of
Holiness,” No. 2, Zion’s Watch Tower
and Herald of Christ’s Presence, 15 de dezembro de 1896, reimpressão, 2008.
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Comentários
Achei muito sábias essas palavras:
“Se a união fosse mais importante que a verdade, não haveria motivos para ser uma TJ [Testemunha de Jeová] ao invés de ser um mórmon ou um católico. No entanto, a superioridade da verdade em relação à união tem sido esquecida quando são as TJs o foco dessa dicotomia; agora a verdade não importa tanto, mas 𝙖 𝙪𝙣𝙞ã𝙤 é 𝙥𝙧𝙞𝙤𝙧𝙞𝙯𝙖𝙙𝙖 𝙚𝙢 𝙙𝙚𝙩𝙧𝙞𝙢𝙚𝙣𝙩𝙤 𝙙𝙖 𝙫𝙚𝙧𝙙𝙖𝙙𝙚.”
É exatamente isso que acontece. A negação ao direito da crítica é exatamente isso: a união é priorizada em detrimento da verdade.
“se os membros do Corpo Governante erram, eles... exigem que
𝙤𝙨 𝙤𝙪𝙩𝙧𝙤𝙨 𝙨𝙚𝙟𝙖𝙢 𝙝𝙪𝙢𝙞𝙡𝙙𝙚𝙨 para aceitar 'novos entendimentos'”.
Irmão, isso é a mais pura verdade também. Eles deviam ser mais humildes, mas a humildade nunca é ordenada a eles, sempre a nós.
Eu confesso que achei muito estranho quando eles falaram para “𝐨𝐛𝐞𝐝𝐞𝐜𝐞𝐫 𝐚 𝐪𝐮𝐚𝐥𝐪𝐮𝐞𝐫 𝐨𝐫𝐢𝐞𝐧𝐭𝐚çã𝐨 𝐬𝐞𝐦 𝐩𝐞𝐧𝐬𝐚𝐫 𝐝𝐮𝐚𝐬 𝐯𝐞𝐳𝐞𝐬”. Como assim? Mas como assim? Eles não erraram antes e não erram ainda? Como assim confiar “sem pensar”? Jeová que me perdoe, mas isso é contra o que a Bíblia ensina. Veja o exemplo dos bereanos.
Concordo com o irmão: é imoral, blasfemo, usar o nome de Jeová para fazer-se incontestável. Isso não pode ser tolerado.
Digo, não que esteja pedindo uma orientação aos autores aqui como sendo um guru espiritual ou líder, apenas uma questão de pedir o seus pontos de vista sobre isso.