Fonte: jw.org
Contribuído.
Em Mateus
28:18 lemos as palavras de Cristo: “É-me dado todo o poder no céu e na terra” (ARC). À base disso, é lógico
concluirmos que, se tal poder foi dado a Jesus, é porque ele antes não o
possuía. Logo, Jesus não é o Deus Todo-poderoso.
Numa
tentativa de refutar essa argumentação lógica, alguns trinitários citam
Apocalipse 4:11, versículo no qual se afirma ser o Deus Todo-poderoso “digno
[...] de receber [...] o poder” (ARC).
Argumentam, então, que é possível ser Todo-poderoso e, ainda assim, receber poder.
Vejamos por
que esse argumento não se sustenta. Trata-se de uma falsa comparação. Os dois
textos possuem três diferenças fundamentais.
A primeira
consiste nos substantivos. Embora a Versão
Almeida Revista e Corrigida use nos dois textos a palavra “poder”, os
termos originais são muito diferentes. Em Apocalipse 4:11 usa-se δυναμις (dýnamis), cujo significado é “poder,
força, habilidade” (Dicionário de Strong). Em contrapartida, o texto de Mateus
28:18 emprega o termo ἐξουσία (exousía), cuja tradução mais exata é “autoridade”.
O Deus Todo-poderoso não recebe autoridade de ninguém.
A segunda
diferença consiste nos verbos. Na declaração de Jesus em Mateus 28:18 aparece o
verbo δίδωμι (dídomi), significando “dar,
conceder” (Dicionário de Vine). Esse verbo aparece 25 vezes nas Escrituras
Gregas Cristãs, o chamado “Novo Testamento”, tendo como objeto o termo ἐξουσία (de que falamos no parágrafo anterior). Em
todos esses casos tal autoridade é dada “de cima para baixo”, de alguém em
posição superior para alguém em posição inferior[1]
(Queira ver Mateus 9:8; 10:1; Marcos 6:7; 13:34; Lucas 9:1; 10:19; João 1:12;
5:27; 17:2; 19:11; Atos 8:19; 2 Coríntios 10:8; 13:10; Apocalipse 2:26). Jamais
a Bíblia fala de alguém “dar autoridade” ao Deus Todo-poderoso[2].
Em contraste, o texto de Apocalipse 4:11 usa o verbo λαμβάνω (lambáno), que significa, entre outras
coisas, “pegar o que me pertence” (Strong); ou seja, “receber” algo no sentido
de obter reconhecimento de que se tem direito àquilo.
A terceira
diferença consiste num simples adjetivo, presente em Mateus 28:18, mas ausente
em Apocalipse 4:11, a saber, πάσα (pása, flexão de πᾶς [pãs]),
traduzido “toda”. O Deus Soberano pode “receber poder” porque ele concedeu
certa medida de poder às suas
criaturas. (1 Crônicas 29:14) Mas ele jamais
poderia receber “todo" o poder, uma vez que apenas ele próprio possui todo
o poder. Para ilustrar: um pai talvez dê uma pequena mesada ao seu filhinho. Se
o filhinho, movido pelo amor ao pai, usa sua mesada para comprar-lhe um
presente, o pai estará recebendo do que já era seu. Em contrapartida, seria
inconcebível que o pai recebesse de seu filhinho todo o seu próprio salário!
Agora, com
base nos três pontos supracitados, já estamos em condições de entender
corretamente Apocalipse 4:11. Como o Deus Todo-poderoso “recebe poder”? Já
vimos que o termo “poder” significa também “força, habilidade”. Sempre que
criaturas apreciativas dedicam a Deus sua força e habilidades, reconhecendo que
as receberam dele, estão, em certo sentido, ‘dando seu poder a Deus’. 1
Crônicas 29:14 declara: “Porque tudo vem de ti, e damos a ti do que é teu” (Almeida Século 21). Como nos explica o Comentário Bíblico do erudito John Gill:
Digno
[...] de receber, isto é, de receber o reconhecimento e atribuição de sua
glória, honra e poder. De outro modo, não se poderia falar de Deus receber
essas coisas de suas criaturas, a não ser por sua confissão e declaração de que
tais coisas pertencem a Ele.
Aqui, um
trinitário talvez alegue que a mesma explicação pode ser dada em relação à
declaração de Jesus em Mateus 28:18. Ou seja, que Cristo falava apenas de um
reconhecimento de sua autoridade inerente. Mas, para sua tristeza, isso é
inviável. Por quê? Porque o próprio Jesus esclareceu o que quis dizer em Mateus
28:18.
Já vimos
ser falha a comparação com Apocalipse 4:11, mas há deveras um texto em
Apocalipse que contém outra declaração do próprio Jesus, na qual ele emprega os
mesmíssimos verbo e substantivo de Mateus 28:18. Trata-se de Apocalipse 2:26,
27: “Ao vencedor e ao que continuar nas minhas obras até o fim darei [δίδωμι; dídomi] autoridade [ἐξουσία; exousía] sobre as
nações, assim como eu recebi autoridade
de meu Pai.”[3]
Pegou o ponto? O Pai dá autoridade
para Jesus do mesmo modo que Jesus dá autoridade
para seus discípulos. É obvio que não se trata
de Cristo reconhecer a autoridade inerente dos seus discípulos, mas de dar-lhes
uma autoridade que até então não possuíam. Da mesma maneira, o Pai dá ao Filho
uma autoridade que este, até então, não possuía. (Essa relação hierárquica
Deus-Jesus-cristãos também está presente no contexto de Mateus 28, pois a
declaração no versículo 18 prefacia sua ordem aos cristãos nos versículos
seguintes; veja também 1 Coríntios 11:3.) Segue-se logicamente que o Pai é
superior ao Filho em poder e autoridade, e que ambos não podem ser o mesmo
Deus.
Tendo em
mente todos os pontos considerados aqui, concluamos com a declaração do próprio
Criador em Jó 41:11 (Almeida Século 21):
“Quem
primeiro deu a mim, para que eu lhe retribua?”
Explicação das siglas usadas:
ABV: A Bíblia Viva.
ARC: Almeida Revista e Corrigida.
A21: Almeida Século 21.
KJA: King James Atualizada.
NTLH: Nova Tradução na Linguagem de Hoje.
NVI: Nova Versão Internacional.
OL: O Livro.
VFL: Versão Fácil de Ler.
Notas:
[1] Talvez alguém cite Lucas 4:6, em que se fala de o Diabo “dar autoridade” a Jesus. Seria o Diabo superior a Jesus? Em relação ao mundo da humanidade apartado de Deus, a resposta é sim, pois o Diabo é o “deus deste mundo” e “governante do mundo” (2 Coríntios 4:4; João 12:31). Deus permitiu que o Diabo tivesse circunstancialmente autoridade superior à de Jesus, assim como se deu, por exemplo, no caso de Pilatos. (João 19:11) Que a inferioridade de Cristo em relação a Deus não pode ser entendida também como circunstancial, vê-se acima na explicação de Apocalipse 2:26, 27. Convém lembrar ainda que Lucas 4:6 contém uma promessa que nunca se concretizou.
[2] Alguém poderia citar, numa tentativa de refutação, Judas 25. Esse texto diz, na Bíblia Pastoral: “ao Deus único, nosso Salvador, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo, seja dada a glória e a majestade, a força e o poder [grego: ἐξουσία, autoridade ]”. Refuta esse texto o que afirmamos, que a Bíblia jamais fala de alguém dar autoridade a Deus? Não, não refuta. Por um motivo muito simples: o verbo “dar” não existe nesse versículo. O original diz μόνῳ θεῷ σωτῆρι ἡμῶν διὰ Ἰησοῦ Xριστοῦ τοῦ κυρίου ἡμῶν δόξα μεγαλωσύνη κράτος καὶ ἐξουσία. Literalmente: “ao único Deus, Salvador de nós, através de Jesus Cristo, Senhor de nós, a glória, a majestade, o poder e a autoridade”. Onde está o verbo “dar”? Não existe! O tradutor precisa suprir um termo para dar sentido à frase. O mais natural é “seja”, no sentido de “continue sendo”. A NTLH verteu: “Por meio de Jesus Cristo, o nosso Senhor, louvemos o único Deus, o nosso Salvador, a quem pertencem a glória, a grandeza, o poder e a autoridade.” (Veja também VFL; ABV: “são dele”). Percebe-se que a inserção de “seja dada” é impossível devido ao final do versículo: “desde sempre, agora e por toda a eternidade.” Se a autoridade é atribuída a Deus “desde sempre” (“antes de todos os tempos”, Bíblia Pastoral), evidentemente ninguém a deu a Ele; Deus sempre a possuiu, ao contrário de Jesus, que a recebeu (Mateus 28:18).
[3] É verdade que o termo grego ἐξουσία (“autoridade”) não aparece em Apocalipse 2:27. A palavra aparece no versículo 26 e está implícita no versículo 27. O original diz, nos dois versículos: δώσω αὐτῷ ἐξουσίαν ἐπὶ τῶν ἐθνῶν [...] ὡς κἀγὼ εἴληφα παρὰ τοῦ πατρός μου. Literalmente: “Eu darei a ele autoridade sobre as nações [...] assim como eu também tenho recebido do Pai de mim.” Que nesta última oração está implícita a palavra “autoridade” (“assim como eu recebi autoridade do meu Pai”) é reconhecido pelas seguintes traduções: A21, KJA, OL, NTLH, NVI, ABV etc.
A menos que haja uma indicação, todas as citações bíblicas são da
Tradução do Novo Mundo da Bíblia Sagrada, publicada
pelas Testemunhas de Jeová.
Contato: oapologistadaverdade@gmail.com
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Comentários
Apologista eu tenho uma duvida acerca da mediação de Jesus
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