Certo programa
televisivo apresentou um debate entre um trinitarista e um unicista. Este
artigo reúne os aspectos relevantes desse debate e os confronta com o que a
Bíblia ensina.
Em primeiro lugar, convém
trazer a lume as definições oficiais de ambas as doutrinas.
O líder religioso
trinitário apresentou o seguinte argumento para justificar a alegada existência
da Trindade: que a Bíblia afirma a existência de um único Deus, mas ao mesmo
tempo afirma que o Pai, o Filho e o espírito santo são, cada um, chamados de
Deus na Bíblia. Assim, concluiu o clérigo perguntando: ‘Como desatar esse nó,
senão por aceitar que Deus seja composto pelos três?
Primeiro, partindo do
pressuposto de que esse argumento seja verdadeiro, deve-se dizer que, a priori, o mesmo argumento pode ser
aplicado à doutrina da unicidade. Assim, em vez de ‘Deus ser composto por três
Pessoas distintas’, ele seria composto por três manifestações (Pai, Filho e
espírito santo). Ou seja, a Trindade não seria a única opção para se desatar
esse nó.
Mas o ponto é que
apenas metade desse argumento é verdadeiro – a parte que alega que a Bíblia
afirma a existência de um único Deus. Mas não é verdadeira a parte do argumento
quando afirma que o Pai, o Filho e o espírito santo são, cada um, chamados de
Deus na Bíblia. Parte alguma da Bíblia declara, nem de modo subliminar ou
indireto, que o espírito santo é Deus.
Nesse momento talvez
alguns pensem no relato de Atos, capítulo 5, envolvendo Ananias e sua esposa
Safira. O texto comumente usado é o transcrito abaixo:
Atos 5:3, 4. ACRF: “Disse então Pedro: Ananias, por que encheu Satanás o teu
coração, para que mentisses ao Espírito
Santo, e retivesses parte do preço da herdade? Guardando-a não ficava para
ti? E, vendida, não estava em teu poder? Por que formaste este desígnio em teu
coração? Não mentiste aos homens, mas a Deus.”
‘É possível mentir a uma força ativa?’ perguntam
os proponentes da pessoalidade do espírito santo. A resposta é sim, se levarmos
em conta que se trata de uma figura de linguagem conhecida como personificação
– atribuir a algo impessoal qualidades de uma pessoa.
Que o espírito santo não é, definitivamente, uma
pessoa espiritual torna-se evidente do versículo 9 do mesmo capítulo de Atos,
onde tal espírito é chamado de “Espírito do Senhor” (ACRF). Logo, o espírito santo não é O Senhor (Deus), mas DO Senhor – é
algo pertencente a Deus.
Ademais, usar
paralelamente as expressões ‘trapacear o espírito santo’ e ‘mentir a Deus’ para
indicar que o espírito santo é Deus é mero sofisma. Se concluirmos que
expressões semelhantes indicariam que os referidos por elas são os mesmos, ou
possuem coincidência de identidade, chegaremos a conclusões absurdas. Veja os
exemplos abaixo:
Marcos 7:10: “Por exemplo, Moisés
disse: ‘Honre seu pai e sua mãe’.”
Mateus 15:4: “Por exemplo, Deus
disse: ‘Honre seu pai e sua mãe’.”
Será que Deus e
Moisés são os mesmos? Essa seria uma conclusão absurda, não é mesmo?
Para uma explanação plena do
assunto, veja os temas Duas regras – uma falsa e uma verdadeira e Malabarismo de textos bíblicos para tentar provar a Trindade.
De fato, esse
argumento usado pelos trinitários de forma recorrente desconsidera a regra da representação,
pela qual o representante é referido como se fosse aquele que é representado
por ele.
Assim, a declaração
do sexto mandamento foi atribuída a Deus por Ele ser o Originador dos mandamentos
do Decálogo, e foi atribuída a Moisés por ele ser o REPRESENTANTE de Deus na
Terra que transmitiu ao povo de Israel tais mandamentos.
Similarmente,
pela mesma razão de Jeová Deus ser a fonte do espírito santo, as Escrituras
atribuem a esse espírito o que é feito a Deus. É por tal razão que encontramos
em Atos 5:3 as palavras do apóstolo Pedro a Ananias: “Por que te afoitou
Satanás a trapacear o espírito santo . . . ?” O versículo seguinte explica:
“Trapaceaste, não homens, mas a Deus.” (Atos 5:4) Isto não significa que o
espírito santo seja Deus, pois Jesus referiu-se a tal espírito como sendo o
“dedo de Deus”. (Luc. 11:20) O dedo de uma pessoa não é a própria pessoa,
apenas faz parte dessa pessoa e é dirigido por ela. Por esta razão, qualquer
dano feito ao dedo de uma pessoa é considerado como tendo sido feito a ela.
Até se pode arguir
que o Filho de Deus seja também um deus, por possuir divindade, ou natureza
divina (assim como o filho de um homem é também humano, por possuir humanidade,
ou natureza humana); mas, jamais se pode afirmar que o dedo de alguém seja esse
mesmo alguém. Portanto, o dedo de Deus não pode ser Deus, mas apenas parte de Deus.
Por conseguinte, esse
“nó” apresentaria quando muito uma dualidade - duas pessoas sendo chamadas de
Deus: o Pai e o Filho. Inclusive, os argumentos subseqüentes apresentados pelo
referido trinitarista no debate para tentar provar sua doutrina na realidade
mostram tão somente uma dualidade: os
dois tronos e os dois nomes.
Vejamos os textos que foram citados.
Apocalipse 22:1: “E ele me mostrou um rio de água da vida, límpido como cristal, que saía do trono de Deus e do Cordeiro.”
Apocalipse 3:12: “Aquele que vencer, eu [Jesus Cristo] o farei
coluna no templo do meu Deus, e ele de modo algum sairá dali. E escreverei
sobre ele o nome do meu Deus e o nome da cidade do meu Deus, a Nova Jerusalém, que desce do céu da parte do meu Deus, e o meu próprio novo nome.”
Ao fazer a citação
desse último texto, o trinitário omitiu o pronome possessivo “meu”, fazendo Jesus
afirmar ‘o nome de Deus’, quando na verdade ele disse “o nome de MEU Deus”. E
isso faz toda a diferença, pois tal expressão desarticula totalmente a fórmula
da Trindade. Afinal, se uma das pessoas é Deus
da outra, é inadmissível se falar em coigualdade!
O objetivo do tal
trinitarista era mostrar a distinção entre Deus, o Pai, e o Filho, Jesus Cristo
– algo que a Bíblia ensina e a unicidade nega. Contudo, além de mostrar tal
distinção, tais textos mostram a ausência de coigualdade entre o Pai e o Filho
– algo que a Bíblia também ensina e a Trindade nega.
O trinitarista fez
menção do recorrente argumento de Deus ser chamado em hebraico de Elohim (literalmente “deuses”). Arguiu
que isso indica uma pluralidade de pessoas. No entanto, além de configurar um
erro teológico, tal argumento comete um simplista erro linguístico, porque Elohim não significa “pessoas” e sim “deuses”.
Assim, por usarem
esse argumento, os trinitaristas se fazem politeístas - adoradores de vários
deuses! O uso que a Bíblia faz da palavra Elohim
para descrever deuses falsos deixa claro que tal palavra não indica
necessariamente um plural numérico. Por exemplo, Dagom, o deus dos filisteus,
foi aludido como Elohim. (Juízes
16:23). E as evidencias históricas indicam que Dagom não constituía uma pluralidade
de deuses, ou de seres, pessoas divinas ou deidades, mas sim um único deus
individual. Na verdade, a pluralidade está na honra ou distinção atribuída ao
ser ou objeto tido como Elohim.
Os eruditos em
hebraico chamam esse recurso dê plural majestático. Quando a alusão é um único
ser individual, os verbos relacionados encontram se no singular, como na
majestosa frase que inicia o relato bíblico: “No principio Deus [Elohim] criou [não diz: “criaram”] os
céus e a terra.” – Gênesis 1:1.
Outra suposta prova
citada a favor da Trindade é o uso da palavra echad ao invés de echid
para Deus.
Também, o uso do
pronome “nós” ou o verbo no plural não prova a pluralidade de pessoas em um só
Deus. O trinitarista citou Gênesis 1:26; 3:22; 11:7. Examinemos cada uma dessas
passagens.
O pronome “nós” e o
verbo no plural significa, não que Deus seja uma pluralidade de pessoas
conversando entre si; mas, antes, significa que Deus estava conversando com
alguém próximo dele. Pois, quando Deus fala somente de si mesmo, ele usa a
primeira pessoa do singular com o verbo acompanhante no singular:
Êxodo 20:1-3: “Então Deus disse todas estas
palavras: ‘Eu
[não: “nós”] sou [singular] Jeová,
seu Deus, que o tirou da terra do Egito, a terra da escravidão. Não tenha
outros deuses além de mim [não:
“nós”].”
Quanto ao unicista,
fez referência a textos tais como Deuteronômio 6:4, João 10:30 e João 14:9-11.
Segue a transcrição de cada um deles.
Deuteronômio 6:4: “Escute, ó Israel: Jeová, nosso Deus, é um só
Jeová.”
João 10:30: “Eu [Jesus] e o Pai somos um.”
João 14:9-11, IBB: “Respondeu-lhe Jesus: Há tanto tempo que estou convosco, e
ainda não me conheces, Felipe? Quem me viu a mim, viu o Pai; como dizes tu:
Mostra-nos o Pai?
Não crês tu que eu estou no Pai, e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo, não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, é quem faz as suas obras.
Crede-me que eu estou no Pai, e que o Pai está em mim; crede ao menos por causa das mesmas obras.”
Não crês tu que eu estou no Pai, e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo, não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, é quem faz as suas obras.
Crede-me que eu estou no Pai, e que o Pai está em mim; crede ao menos por causa das mesmas obras.”
O primeiro texto (Deuteronômio
6:4) não prova a unicidade e sim o unitarismo – a crença biblicamente pautada
de que Deus é uma única Pessoa, ou Ser. Os demais textos enfocam novamente a
dualidade (a relação de duas pessoas entre si, o Pai e o Filho, mas não indica
coigualdade entre eles, como apregoa a Trindade, nem afirmam que os dois sejam
o mesmo Ser, como alega a Unicidade.
O próprio Jesus
explicou o que queria dizer em João 10:30 em outra passagem:
“E rogo não somente por estes, mas também por
aqueles que pela sua palavra hão de crer em mim; para que todos
sejam um; assim como tu, ó Pai, és em mim, e eu em ti, que também eles sejam um
em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. E eu lhes dei a glória
que a mim me deste, para que sejam um,
como nós somos um; eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, a fim de que o
mundo conheça que tu me enviaste, e que os amaste a eles, assim como me amaste
a mim.” – João 17:20-23, IBB.
“Unidade” não é unicidade, e sim união. Ou seja,
os discípulos de Jesus não se tornariam um único Ser junto com o Pai e o Filho,
mas seriam unidos entre si assim como o
Pai e o Filho são unidos entre eles.
Por isso, a Tradução
do Novo Mundo da Bíblia Sagrada verte o texto de forma clara e moderna:
“Eu peço não somente por
estes, mas também por aqueles que depositam fé em mim por meio das palavras
deles, para que todos sejam um, assim como tu,
Pai, estás em união comigo e eu estou em união contigo, para que eles
também estejam em união conosco, a fim de que o mundo acredite que tu me
enviaste. Eu lhes dei a glória que tu me deste, a fim de que eles sejam um, assim como nós somos um. Eu em
união com eles, e tu em união comigo, a fim de que estejam perfeitamente unidos,
para que o mundo saiba que tu me enviaste e que os amaste assim como me
amaste.”[1]
A consideração acima mostra
claramente que tanto a Trindade como a Unicidade são teorias antibíblicas, que
apenas serviram para distorcer a verdadeira identidade de Deus e também a de
Jesus Cristo.
Siglas usadas:
ACRF: Almeida Corrigida e Revisada Fiel.
IBB: Almeida da Imprensa Bíblica Brasileira.
A menos que haja uma indicação, todas as citações
bíblicas são da Tradução do Novo Mundo da Bíblia Sagrada.
Os
artigos deste site podem ser citados
ou republicados, desde que seja citada a fonte: o site www.oapologistadaverdade.org
[1] Para uma consideração da exatidão da expressão “em união com” em
João capítulos 14 e 17, veja o artigo João 10:30 “Eu e o Pai somos um”, no blog Tradução do Novo Mundo Defendida.
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