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O adjetivo grego állos prova que o “Espírito Santo” é uma pessoa? (Parte 1)

Fonte da ilustração:
http://wol.jw.org/pt/wol/d/r5/lp-t/1102014719

A conversa respeitosa que se segue girou em torno do artigo “O ‘outro Consolador’ é uma pessoa?”. Esse artigo mostrou que alguns trinitários usam o argumento de que a palavra “outro” (állos em grego) para consolador (em João 14:16) se referindo ao espírito santo indicaria que o espírito santo é uma pessoa.

O artigo supracitado explicou:

O texto descreve as palavras de Cristo, nas quais ele afirma a seus discípulos que o Seu Pai daria “outro [állos] Consolador”, referindo-se ao espírito santo. À base disso, Jesus deu a entender que ele próprio era um “Consolador”. Em vista disso, os que propõem que o espírito santo é uma pessoa raciocinam da seguinte forma: ‘Uma vez que Jesus é uma pessoa, o “outro” [állos], significando “outro da mesma espécie”, forçosamente faz com que o espírito santo seja também uma pessoa.’ Querem com isso estabelecer a suposta personalidade do espirito santo.

Em seguida, esse artigo mostrou biblicamente que állos pode realmente ser usado, no mesmo texto, com relação a alguém e a algo impessoal, citando Isaías 45:21 na Versão Septuaginta, grega, que reza:

εγω ο θεος και ουκ εστιν αλλος πλην εμου
        Egó ho theós kaì ouk estin állos plen emoù  
Eu    o  Deus  e    não  há     outro    além  de mim.

À base disso, tal artigo argumentou:

Uma vez que o “Deus” a que o texto se refere é um Ser pessoal  (Jeová), se fôssemos seguir a regra dos trinitaristas, o állos (o ‘outro da mesma espécie’) teria de ser também um ser pessoal. Contudo, o contexto de Isaías mostra justamente o contrário: os deuses das nações são coisas impessoais! 

Para comprovar a veracidade do enunciado acima, foram citadas passagens do contexto. Isaías 45:20 (o versículo anterior) mostra que a passagem se referia a uma “imagem esculpida”. O mesmo é confirmado em Isaías 44:14-17 e 46:7.

Assim, o “outro” (állos) não é um ser pessoal, e sim um objeto sem vida.

Mas um leitor teceu questionamento sincero sobre tal argumentação. Segue abaixo a conversa que tive com ele, que foi registrada nos comentários do artigo retrocitado:

Luiz:

Olá, Apologista da Verdade.
Bom dia.

Parabéns pelo estudo. A sua dedicação e empenho são louváveis. Eu entendo que vocês têm muito respeito e zelo pela Bíblia.

Em Isaias 45:20, Isaías 44:14-17 e Isaías 46:7, embora sejam objetos materiais e, portanto, impessoais, porém remetem a um ser onde a representação daquele objeto aponta para um deus pessoal.

Em Isaías 45:20, diz-se que os seres humanos rogam a um deus que, de acordo com a crença deles, poderia agir.

Em Isaías 46:6-7, no versículo 6 aparece a palavra "deus" indicando que, embora eles tivessem feito um imagem, eles criam que existia um ser espiritual que poderia fazer algo.

Isaías 44:14-17, no versículo 15, aparece a palavra "deus" e segue o mesmo raciocínio anterior.

Nas três passagens é usada a palavra "deus", remetendo a um ser espiritual que, de acordo com a crença deles, poderia fazer algo.

Temos que entender o seguinte: a visão bíblica é de que só existe um Deus; logo, não existem outros deuses; e que adorar as imagens significa tão somente adorar objetos matérias. Porém, para aquelas pessoas as imagens representavam seres pessoais.

Então, temos que os objetos materiais são sim impessoais, mas o que eles representam seriam seres pessoais. 

Um grande abraço.

Apologista da verdade:

Prezado Luiz:

Ainda que REPRESENTEM seres pessoais, o ponto é que se tratam de COISAS IMPESSOAIS, e a palavra állos é aplicada gramaticalmente pelo contexto A COISAS IMPESSOAIS. Esse é o ponto em questão.
Luiz:

Olá, Apologista da Verdade.
Boa tarde.

Muito interessante seu comentário; porém, permita-me fazer algumas considerações:

Embora seja verdade que a palavra aponta para objetos materiais, porém a compreensão correta do que a Bíblia realmente quer dizer é que aqueles objetos materiais representavam seres pessoais e isso é importante observar; pois, se não representassem tais objetos, ficaria sem sentido eles terem aqueles ídolos.

Para Deus aqueles deuses simplesmente não existiam; porém, para aqueles seres humanos eles existiam. Então, não considerar isso impede a correta compreensão; pois na Bíblia tem algo interessante, que é o que está escrito e o que a Bíblia quer dizer. Conforme I Coríntios 2:13, a Bíblia tem uma mensagem espiritual; e isso não é ir além do que está escrito, mas é ir exatamente no que a Bíblia quer ensinar.

Um abraço.

Apologista da verdade:

Prezado Luiz:

O artigo analisou a gramática, não a semântica. E, gramaticalmente, o termo állos é aplicado a objetos impessoais, mesmo que semanticamente tais coisas representem seres pessoais. Exemplo: quando a Bíblia diz que "o amor é paciente e bondoso" (1 Coríntios 13:4a), semanticamente entendemos que é a pessoa que tem amor que demonstra tais qualidades. Mas, gramaticalmente, fala-se do amor (qualidade) como tendo tais qualidades, mostrando que se trata de uma personificação do amor. Állos foi aplicado gramaticalmente a coisas impessoais, ainda que semanticamente tais coisas fossem entendidas como pessoais. Estamos falando de gramática. Espero que esses comentários o ajudem a entender o artigo acima.

Luiz:

Olá, Apologista da Verdade.
Bom dia.
Muito obrigado pela sua resposta.

Tanto a gramática quanto a semântica são importantes; porém, a compreensão bíblica deve ser espiritual, conforme 1 Coríntios 2:13. Nesse caso, a questão da compreensão gramatical não exclui a compreensão semântica.

Mesmo que nesses casos se considere a questão gramatical apenas, se trata de um ser Pessoal com objetos materiais, diferente da passagem do Espírito Santo, onde o mesmo é um ser espiritual.

Em um primeiro momento, realmente se fala de gramática, onde, para a correta compreensão, se pede a questão da semântica, ou seja, a interpretação correta é espiritual; pois a mensagem bíblica é essencialmente espiritual e é a compreensão espiritual é que vai dar a percepção do que realmente o texto quer dizer.

Em I Coríntios 13:4, repare que, no versículo 1 Paulo fala dele, ou seja, um ser pessoal.

Um grande abraço.

Apologista da verdade:

Luiz, você está correto quando diz que é importante a compreensão espiritual. (1 Coríntios 2:13) A gramática está em segundo plano, e tem suas limitações. Também, ela não contradiz a compreensão espiritual. No caso do espírito santo, "ao explicarmos assuntos espirituais com palavras espirituais", vemos claramente que se trata de algo impessoal, da força ou energia de Deus, e a gramática concorda com isso, embora os trinitaristas tentem usá-la para provar o contrário.

Luiz:

Olá, Apologista da Verdade.
Boa tarde.

Respeito sua opinião sobre o tema, mas a semântica não está dentro da Gramática?

Achei interessante sua observação sobre estar falando de Gramática, mas a interpretação bíblica não se limita apenas à Gramática, conforme 1 Coríntios 2:13.

Um abraço.

Apologista da verdade:

Sr. Luiz, como já respondi acima, devemos ter compreensão espiritual. E a compreensão espiritual mostra que a Palavra de Deus menciona os deuses pagãos como sendo coisas impessoais, e não explica que, para os pagãos, tratava-se de seres pessoais. Porque, do ponto de vista do Criador, Jeová, e de seu povo no passado – os israelitas – bem como para nós (inclusive, creio, para o senhor também) tais deuses não passavam de estátuas sem vida. Nesse respeito, tanto o sentido INTERPRETATIVO ESPIRITUAL (o bíblico) quanto o TEXTUAL (gramatical) se unem para mostra que állos pode ser aplicado no mesmo contexto a um ser pessoal (O Deus Todo-Poderoso) e a seres impessoais (os deuses das nações).

Espero que o comentário acima possa ter sido mais esclarecedor.

Abraços.

Luiz:

Olá, Apologista da Verdade.
Bom dia.

Muito obrigado pela sua resposta, e respeito muito sua opinião.

Realmente, não está escrito de forma explícita na Bíblia que os pagãos consideravam os deuses como seres pessoais; mas, se eles tinham imagens de deuses, então isso teve algum motivo e seria bem lógico pensar que os pagãos imaginassem que aqueles ídolos representassem deuses pessoais.

Correto seu entendimento de que, para cristãos e cristãs, os deuses são imagens de ídolos assim como para Moisés, Jó, Davi e outros também. Mas, e para os pagãos, como eles viam essas imagens?

As imagens eram impessoais, mas o que elas representavam eram seres pessoais. E, embora como você muito bem observou, a palavra állos esteja ligada a objetos impessoais, a compreensão não para por aí, mas continua, e é aí que a questão gramatical se junta a com a correta compreensão espiritual.

Um grande abraço e muitas felicidades.

Apologista da verdade:

Prezado Luiz:

Apreciei muito seus comentários sinceros e respeitosos.

Concordo com você desde o começo de nosso diálogo que, para os idólatras, as imagens representavam seres pessoais.

Mas, como você mesmo concordou, o conceito bíblico é o de que tais imagens nada mais são do que objetivos impessoais. E a palavra állos é usada dentro do CONCEITO BÍBLICO – portanto, tanto em sentido gramatical quanto espiritual (ponto de vista bíblico) se refere em Isaías 45:21 a OBJETOS IMPESSOAIS.

Grande abraço!

Fim da conversa.

O último argumento que usei fechou o assunto. Pois mostrou que, mesmo levando em conta o conceito semântico, interpretativo e espiritual, os deuses das nações não são pessoais. Isto porque a Bíblia foi inspirada por Deus e, por consequência, revela os conceitos DELE. (2 Timóteo 3:16) E PARA ELE, tais estátuas não são pessoas, não importando o conceito dos pagãos que idolatravam tais objetos.

Assim, tanto gramatical quanto espiritualmente, állos (“outro”) em Isaías 45:21 se refere a algo impessoal.

Portanto, o argumento trinitário envolvendo állos em João 14:16, 17 para tentar provar a personalidade do espírito santo é tanto gramatical quanto espiritualmente errado.

O próximo artigo deste tema esclarecerá adicionalmente o assunto.


A menos que haja uma indicação, todas as citações bíblicas são da Tradução do Novo Mundo da Bíblia Sagrada, publicada pelas Testemunhas de Jeová.

A menos que seja indicada outra fonte, todas as publicações citadas são produzidas pelas Testemunhas de Jeová.




Os artigos deste site podem ser citados ou republicados, desde que seja citada a fonte: o site www.oapologistadaverdade.org

Comentários

Anderson disse…
Olá. Com sua vênia, gostaria de expressar um argumento. Longe de apoiar a doutrina da Trindade, entendo que, mesmo que não haja evidência no texto bíblico de que "állos" possa se aplicar a coisas impessoais, isso não é nem de longe uma base onde apoiar as frágeis ideias trinitaristas. Mas me parece que o texto citado, de Isaías 45:21 da LXX, não prova realmente o uso de "állos" para relacionar alguém a algo. Isso porque o texto apresenta uma negativa: 'Não há outro além de mim'. A palavra "outro" (állos) não se refere aqui às imagens esculpidas e nem a quaisquer deuses impessoais, por que estas coisas existem de fato. "Há" imagens e "há" deuses. Mas o texto diz que "não há" outro. Neste caso, o termo oculto nesta zeugma é "Deus", em maiúscula, representando um Deus pessoal e altíssimo (a exemplo de como a NWT verte esse versículo). Este de fato "não há", além de Jeová. E é a este "outro" Deus, que é inexistente segundo o texto, mas que carrega consigo a ideia de personalidade, que "állos" se refere, no meu humilde entendimento. Por isso, suponho que isto não sirva para evidenciar o que foi proposto sobre o uso de "állos" para coisas impessoais.

Ainda assim, apreciei muito a discussão a respeito do tema, e aproveito para elogiar as excelentes pesquisas. Se tiveres um contrapondo a esse meu ponto de vista, terei prazer em lê-lo.
Prezado Anderson:

Agradeço pela sua expressão de apreço pelos artigos deste site e pela sua contribuição argumentativa. O seu raciocínio está inteiramente correto no viés que você o apresentou. Em Isaías, Jeová afirma que não há outro theós – Deus – (da mesma espécie) além dele próprio.

Sobre o texto de Isaías 45:21, o artigo “O ‘outro Consolador’ é uma pessoa?” comentou:

"Uma vez que o 'Deus' a que o texto se refere é um Ser pessoal (Jeová), se fôssemos seguir a regra dos trinitaristas, o állos (o ‘outro da mesma espécie’) teria de ser também um ser pessoal. Contudo, o contexto de Isaías mostra justamente o contrário: os deuses das nações são coisas impessoais!"

Como você mesmo reconheceu, a negativa mostra que não existe outro Deus da mesma espécie que Jeová. Por outro lado, é evidente pelo contexto imediato e mediato, que há um contraste com os deuses das nações pagãs. Para os pagãos, cada um dos seus deuses seria “outro” [állos] em relação ao Deus Jeová, o qual para eles não passava de um deus nacional e territorial. Essa premissa é a razão de Jeová afirmar que “não há outro [állos]” semelhante a ele. Tal afirmação divina só tem razão de ser em face da alegada semelhança, tida pelos pagãos, entre seus deuses e Jeová. Para os pagãos, seus deuses eram seres pessoais e salvadores, tal qual Jeová era para o Seu povo. Assim, contextualmente, o pagão considerava seu deus állos (outros da mesma espécie) que Jeová, o que Ele nega terminantemente. Para Jeová, os deuses pagãos eram héteros (θεοῖς ἑτέροις; theoîs hetérois, “outros deuses” de espécie diferente; Êxodo 34:14, LXX). Mas não para os pagãos.

Assim, escrituristicamente subentendida está a ideia de que, para os pagãos, állos se aplicava a seus deuses em comparação com Jeová, único entendimento que explica a afirmação corretiva por parte de Jeová, de que não há outro igual a Ele.

Espero ter sido de ajuda.

Abraços!

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